Investigação sobre o seqüestro de uma equipe do diário O Dia : quatro novos presos
Dos quatro indivíduos detidos, no dia 11 de dezembro de 2008, no Rio, três são policiais militares. Dois supostos chefes da milícia do Batan já foram encarcerados no passado mês de junho.
Repórteres sem Fronteiras se felicita pelos progressos da investigação sobre o seqüestro e as torturas de que foram vítimas, no dia 14 de maio de 2008, no Rio de Janeiro, uma jornalista e um fotógrafo do diário regional O Dia e o seu motorista. Quatro indivíduos procurados no âmbito deste processo foram detidos no Rio, a 11 de dezembro de 2008, numa operação policial que mobilizou cerca de 80 agentes. Três dos presos são policiais militares : Fábio Gonçalves Soares (conhecido como “Fabinho Catiri”), Marcos Antônio Alves da Silva (“Marcos do Bope”) e André Luiz de Mattos (“Cocada”). O quarto homem foi identificado como Nilson Bueno (“Nilson Faustão”). Entre os objetos apreendidos na mesma ocasião, constava uma camisa com o símbolo do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais, a unidade de elite da Polícia Militar do Estado do Rio). Os quatro indivíduos deverão responder pelo crime de “formação de quadrilha armada”. Outros quatro policiais militares são igualmente procurados.
O caso do Batan, nome da favela em que sucederam os acontecimentos, provocara uma considerável emoção no Brasil. Duas semanas depois de se terem instalado no bairro, os empregados de O Dia foram raptados e torturados durante sete horas. Os dois supostos chefes da milícia do Batan, o inspetor da Polícia Civil Odnei Fernando da Silva (“Dinei” ou “Zero Um”) e Davi Liberato de Araújo (“Zero Dois”) já haviam sido presos no mês de junho.
“Saudamos os progressos significativos na resolução deste caso, e esperamos que, dentro em breve, o julgamento permita esclarecer as circunstâncias deste drama e apurar todas as responsabilidades. Essa investigação deve servir como exemplo na luta contra a impunidade. Por outro lado, vem confirmar a existência de graves excessos na atuação das unidades de polícia, que exigem uma resposta de grande envergadura”, declarou Repórteres sem Fronteiras.
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18.06.08 - Torturas aos funcionários do diário O Dia : o presumível chefe da milícia do Batan se entrega às autoridades
No dia 16 de junho, se rendeu às autoridades o inspetor da Polícia Civil Odnei Fernando da Silva, conhecido conhecido como “01”, “Dinei” ou “Águia”, acusado de ser o chefe da milícia que sequestrou e torturou três empregados do diário O Dia, no passado dia 14 de maio, na favela do Batan, no Rio de Janeiro. Em fuga desde 4 de junho sob mandado de captura, o policial se apresentou, acompanhado de seu advogado, à Delegacia de Repressão às Ações Criminosas e de Inquéritos Especiais (DRACO/IE).
Em seu depoimento inicial, Odnei Fernando da Silva negou qualquer envolvimento nos atos de tortura infligidos aos dois jornalistas e seu motorista, alegando que, no dia dos fatos, se encontrava em uma festa no bairro carioca de Bangu. Interrogado sobre a sua relação com o suposto número dois do grupo, Davi Liberato de Araújo, já detido, o inspetor declarou que se conheciam desde a infância mas que já não mantinham contato. O presumível líder da milícia do Batan foi posteriormente levado para a prisão especial para policiais do Complexo Penitenciário de Gericinó. Repórteres sem Fronteiras se felicita uma vez mais pelos progressos da investigação e espera que as responsabilidades dos atos de barbárie cometidos contra os funcionários de O Dia sejam rapidamente apuradas.
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06.06.08 - Torturas a três empregados do diário O Dia : um suspeito detido e um policial foragido identificado como chefe da milícia
Agentes da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas e de Inquéritos Especiais (DRACO/IE) apresentaram à imprensa, no dia 4 de junho de 2008 no Rio de Janeiro, um primeiro suspeito no caso dos atos de barbárie sofridos por uma equipe de reportagem do diário O Dia, no dia 14 de maio, na favela do Batan. Trata-se de Davi Liberato de Araújo, de 32 anos, apelidado de “02” por ocupar supostamente o segundo posto na hierarquia da milícia paramilitar que sequestrou e torturou uma jornalista, um fotógrafo e o seu motorista. O indivíduo, que cumpre pena de prisão em regime semi-aberto, assegurou que no momento dos fatos se encontrava na cadeia. Os investigadores também identificaram o chefe da milícia do Batan, Odnei Fernando da Silva, de 35 anos, conhecido como “01”, “Dinei” ou “Águia”.
Ex-agente penitenciário e inspetor da polícia civil, este último já foi preso em uma ocasião por homicídio. Atualmente se encontra em fuga, com mandado judicial de captura. A DRACO/IE investiga igualmente a possibilidade de envolvimento de policiais militares e a existência de um cemitério clandestino utilizado pela milícia do Batan. Por outro lado, a jornalista de O Dia afirmou ter reconhecido, durante a sessão de tortura, a voz de um assessor parlamentar do deputado estadual Coronel Jairo, que desmentiu a informação e condenou vigorosamente os atos da milícia do Batan.
Repórteres sem Fronteiras se felicita dos rápidos progressos da investigação e espera que o testemunho de Davi Liberato de Araújo permita identificar os responsáveis pelo sequestro da equipe de O Dia. A organização aguarda igualmente a pronta detenção de Odnei Fernando da Silva.
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02.06.08 - Três funcionários do diário O Dia sequestrados e torturados por uma milícia: Repórteres sem Fronteiras solicita a criação de uma comissão de investigação federal
Exm°s Srs.
Luiz Inácio Lula da Silva
Presidente da República Federativa do Brasil
Tarso Genro
Ministro da Justiça
Sérgio Cabral
Governador do estado do Rio de Janeiro
Chegaram certamente ao vosso conhecimento as revelações sobre o sequestro e os atos de crueldade de que foram vítimas, no dia 14 de maio de 2008, uma jornalista, um fotógrafo e um motorista do diário O Dia. Repórteres sem Fronteiras ficou perplexa ao saber que tais ações foram cometidos por agentes da ordem pública, supostamente encarregues de lutar contra a insegurança e o tráfico de droga nos bairros mais problemáticos. No comportamento destes funcionários do Estado - policiais, agentes penitenciários, bombeiros, empregados das forças de autoridade - organizados em milícias, não se vislumbra nenhuma diferença em relação aos indivíduos que têm como missão combater.
Este caso, de uma extrema gravidade, vem-se juntar a outros recentes ataques contra a mídia envolvendo agentes de polícia, em especial nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo. Estes abusos de poder exigem, a nosso ver, a criação de uma comissão de investigação federal, em conexão com as autoridades estaduais, encarregue de esclarecer e castigar as ações deste tipo de milícias.
Os jornalistas, acompanhados pelo seu motorista, realizavam uma reportagem sobre o tema. Desde o início do mês de Maio, viviam na Favela du Batan, em Realengo, na zona oeste do Rio. No dia 14 de maio, o fotógrafo e o motorista se dirigiam a uma suposta festa quando foram raptados por uma dezena de homens armados. Segundo a redação de O Dia, estes tentaram incitar os moradores do bairro a linchar os dois homens, antes de os introduzirem num veículo de modelo Polo, de cor vermelha e com a placa KPB 4592. Mais tarde, por volta das 21 horas, os milicianos capturaram a jornalista no seu domicílio na favela e a levaram no mesmo automóvel que seus companheiros. Nesse momento, um dos milicianos a avisou : “Você é do jornal O Dia e está presa por ‘falsidade ideológica'.”
Durante sete horas, os jornalistas - privados de seu material - e seu motorista estiveram à mercê de cerca de vinte milicianos numa prisão secreta : sufocamento com sacos plásticos, choques elétricos, roleta russa, mutilações. Ameaçados de morte pelos seus verdugos, as vítimas foram finalmente libertadas por volta das 4 da manhã. Encontram-se atualmente num local seguro e sob assistência médica e psicológica. De forma a não perturbar a investigação aberta pela Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, o caso só foi divulgado a 31 de maio. O Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro qualificou o episódio como “um dos mais graves atentados à liberdade de informação no País desde o fim da ditadura”.
As milícias deste tipo - um fenómeno relativamente recente, segundo a imprensa carioca - dominam 78 localidades como uma verdadeira mafia. De acordo com O Dia, estariam por detrás de cerca de 200 assassinatos cometidos ao longo dos três últimos anos. A sua presença ameaça diretamente as garantias do Estado de direito estabelecidas pela Constituição Federal de 1988 : é por esta razão que Repórteres sem Fronteiras solicita uma ação de grande envergadura contra estas organizações criminosas.
Agradecendo a atenção concedida à presente carta, queiram, Exmº Srs., receber os nossos votos da mais alta estima e consideração.
Robert Ménard
Secretário Geral