Eleições no Brasil: Cobertura dos atos de 7 de setembro mobiliza ataques contra a imprensa
Durante a quarta semana da campanha eleitoral no Brasil, a cobertura dos atos mobilizados pelo Presidente Bolsonaro para o bicentenário da independência do Brasil, em 7 setembro, esteve na origem de parte importante dos ataques mais intensos da semana. As agressões contra a jornalista Amanda Klein também apareceram em destaque no levantamento durante o período, após ter sido alvo de falas misóginas por parte do Presidente Bolsonaro em entrevista para a emissora Jovem Pan.
Na semana de 4 a 11 de setembro, a Repórteres sem Fronteiras (RSF) registrou 33.072 agressões contra a imprensa no Twitter, com base no monitoramento de perfis de 120 jornalistas, assim como de termos ofensivos e hashtags de ataque. O principal evento da semana foram os atos em 7 de setembro, bicentenário da independência do Brasil, quando o Presidente Bolsonaro reuniu apoiadores em Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. A cobertura desses atos e das falas do presidente esteve na origem de parte importante dos ataques mais intensos da semana.
No período, o levantamento da RSF identificou 74 hashtags utilizadas para descredibilizar o papel da imprensa. Pela quarta semana consecutiva, a hashtag mais utilizada para esse fim foi #GloboLixo, mencionada 10.592 vezes. Outras hashtags relevantes na semana foram #Globolixoderretendo (4.056), #CNNlixo (3.277), #UOLixo ou #UOLlixo (475), #Imprensalixo (380), #Folhalixo (286), #Globolixoepetista (179), #Ripjornalismo (171), #Jornalismoprofissionalmorreu (119), #Midialixo (97) e #Veravergonhadojornalismo (96).
As principais hashtags ofensivas à imprensa representam críticas diretas aos maiores grupos de mídia no país, como Rede Globo, CNN, UOL e Folha de S.Paulo e seu uso está relacionado diretamente à campanha eleitoral. O grafo abaixo evidencia a relação de hashtags como #bolsonaroreeleitoem2022 e #bolsonaronoprimeiroturno a #jornalnacional, #globolixo e #cnnlixo. Esse comportamento indica que há uma conexão entre o uso de hashtags de ataque ao jornalismo e hashtags de apoio ao presidente da República.
No período, também foi possível identificar as principais contas que utilizaram tais hashtags. O perfil @pinoquio_bonner foi o que mais atacou jornalistas e veículos de imprensa, 192 vezes. Além deste, outros que se destacam na estigmatização do jornalismo são: @antonioalvespho, @anderson_a_mach, @mcn88086, @machadoands e @cleidegolagf. Os usuários @antonioalvespho, @anderson_a_mach e @machadoands aparecem entre os principais agressores pela segunda semana consecutiva.
Alvos da semana
Os jornalistas que mais foram alvos de postagens contendo termos ofensivos na semana de 04 a 11 de setembro foram Vera Magalhães (2.172 posts), Miriam Leitão (1.081), Andréia Sadi (506), Eliane Cantanhêde (498), Monica Bergamo (436), Reinaldo Azevedo (431), Amanda Klein (399), Milton Neves (288), Ricardo Noblat (265) e Basília Rodrigues (244).
Durante o ato em apoio ao presidente Bolsonaro em 7 de setembro, no Rio de Janeiro, chamou a atenção o cartaz com a foto da jornalista Vera Magalhães, com a frase dita por Bolsonaro no debate da Band entre candidatos, no dia 28 de agosto. A frase repercutiu fortemente nas redes na semana anterior e seguiu sendo replicada nesta.
Seguem alguns exemplos de postagens contra jornalistas que foram destaque na semana:
Outro caso que ganhou destaque na semana foi o da jornalista Amanda Klein, apresentadora da RedeTV e comentarista na Jovem Pan. Em sabatina com Bolsonaro na Jovem Pan no dia 06 de setembro, a jornalista perguntou ao presidente sobre a compra de imóveis em dinheiro vivo por sua família, repercutindo reportagem publicada pelo UOL dias antes. Em resposta, Bolsonaro disse: “Amanda, você é casada com uma pessoa que vota em mim. Não sei como é o teu convívio com ele na sua casa”. Também falou que ela fazia uma “acusação leviana” contra ele.
Após a agressão, Amanda Klein passou a figurar entre os seis jornalistas mais atacados da semana. As agressões foram marcadas por termos misóginos e violentos e a hashtag #amandakleinleviana, utilizando as palavras do presidente, também repercutiu nos comentários na conta da jornalista, com 71 citações. Foram identificadas 43 hashtags de ofensas no seu perfil, com destaque para #CalaBocaAmanda, #ForaAmanda, #AmandaKleinVeronhaNacional e #ForaAmandaKlein.
Outra jornalista que não estava no radar dos apoiadores de Bolsonaro e passou a sofrer ataques por comentários críticos ao presidente durante o 7 de setembro foi Basília Rodrigues, apresentadora da CNN Brasil. Ela recebeu 244 postagens ofensivas e figurou na lista de 10 jornalistas mais atacados da semana. Basília Rodrigues é uma mulher negra e conteúdos misóginos e racistas estiveram no centro das postagens, como tem sido o padrão desse tipo de agressão online. No perfil da jornalista foram encontradas 42 hashtags de ataques, entre elas #ImprensaLixo, #PedeDesculpaBasiliaCnn, #BasiliaVaiEstudar e #JornazistasMilitantes.
O papel das autoridades
O ex-secretário de Cultura do governo Bolsonaro e candidato a deputado federal por São Paulo, Mário Frias, segue se destacando como um vetor de ataques contra jornalistas nas redes. Em uma de suas postagens na semana em análise, em resposta a comentários da jornalista Vera Magalhães sobre os atos de 7 de setembro, Frias ironiza: “Hoje ela infarta”. O post teve alcance de 1.202.553 perfis no Twitter. Em outra publicação, o candidato ataca a jornalista Miriam Leitão, a quem chama de “patética”. O post teve alcance de 823.859 perfis. Em uma terceira, ele ofende Amanda Klein, perguntando: “Será que a Amanda não cansa de passar vergonha?”. O post teve alcance de 794.900 perfis.
Sobre o projeto
Durante as eleições (16 de agosto a 30 de outubro), a Repórteres sem Fronteiras (RSF) realiza um monitoramento sistemático das redes sociais, em particular do Twitter, para analisar e decifrar o alcance e os padrões por detrás dessa hostilidade crescente contra o jornalismo. Até o final do segundo turno, 120 jornalistas e comentaristas, além de perfis de autoridades públicas e candidatos às eleições, serão acompanhadas diariamente em parceria com o Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic) da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), centro de pesquisa de referência especializado em análise de redes sociais e tendências digitais.
A RSF publica análises semanais com base nos levantamentos realizados, que serão compilados nesta página.