Avalancha de ações judiciais contra os jornalistas: o assédio judicial é outra forma de censura
Carlos Santos, jornalista independente da cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte, foi condenado neste mês de fevereiro de 2011 a doar a quantia de 6 000 reais (2 600 euros) a associações filantrópicas devido a três comentários contra a prefeita da localidade, Fátima Rosado, publicados no seu blog (http://www.blogdocarlossantos.com.br/). A multa substitui a sentença inicialmente proferida de um mês e quatro dias de prisão por cada um dos comentários, mais de três meses no total. “Estou sitiado, mas bem”, declarou o jornalista a Repórteres sem Fronteiras a 24 de fevereiro.
Carlos Santos enfrenta atualmente 27 ações judiciais e 9 interpelações, ainda em andamento, na sequência de queixas de responsáveis políticos e administrativos locais, que se consideram “ofendidos” pelos seus textos. Até hoje, o jornalista foi condenado em três ocasiões a penas de prisão por “injúrias”, convertidas em multa pecuniária. Em três outros processos do mesmo tipo, foi absolvido.
“É certo que os comentários de blog pelos quais Carlos Santos foi condenado podem ser considerados veementes. Porém, dois deles dizem respeito à suposta incapacidade da prefeita Fátima Rosado no desempenho de suas funções, enquanto que o terceiro comentário nem sequer nomeia ninguém em particular. A questão reside sobretudo na quantidade excessiva de ações ingressadas como resposta aos comentários ou artigos vistos como um ataque à reputação de uma autoridade pública. O assédio judicial é outra forma de censura”, declarou Repórteres sem Fronteiras.
“Uma pena de prisão por um delito de imprensa é contrária à Constituição democrática de 1988, que garante a liberdade de expressão em todas as suas formas. Uma etapa fundamental na conquista dessa liberdade foi a revogação pelo Supremo Tribunal Federal, em maio de 2009, da Lei de Imprensa de 1967, promulgada durante a ditadura militar. Porém, incompreensivelmente, alguns juízes continuam decretando penas de prisão em processos de difamação ou injúria ou impondo aos meios de comunicação uma censura preventiva. A Constituição e a jurisprudência federal devem ser aplicadas em todo o território brasileiro”, acrescentou a organização.
No decorrer desse mesmo mês, o juiz Antônio Carlos Almeida Campelo, do Pará, enviou uma intimação a Lúcio Flávio Pinto, responsável pelo Jornal Pessoal. O magistrado ordenou ao jornalista que deixe de publicar informações relacionadas com o processo dos executivos do Grupo O Liberal, proprietário de vários meios de comunicação regionais, acusados de fraude financeira pela justiça federal. Se não cumprir a intimação, Lúcio Flávio Pinto será preso e condenado a uma multa de 200 000 reais (87 000 euros) por “violação do segredo de justiça”. Mas, de acordo com o jornalista, a iniciativa do juiz Almeida Campelo não parte de um requerimento dos acusados.
Outra vítima de uma avalancha de queixas, Lúcio Flávio Pinto é ou já foi alvo de cerca de trinta ações, devido a seus artigos que denunciam os ataques ao meio ambiente e os tráficos de matérias-primas na região amazónica. Sua situação faz lembrar a do documentarista José Huerta, vítima de oito ações, das quais uma por “crime”, após ter revelado no seu último filme os efeitos nefastos do desenvolvimento turístico no Ceará.