Em estudo sobre marco normativo brasileiro para o jornalismo, RSF aponta fragilidades e propõe caminhos para seu fortalecimento

A legislação brasileira garante o direito à liberdade de imprensa, mas é notável a ausência de um marco normativo estruturado que sustente de modo permanente políticas públicas e ações de Estado para promover um ambiente mais favorável ao exercício do jornalismo. Elaborado pela Repórteres Sem Fronteiras (RSF), o estudo “Marco Normativo e Políticas Públicas sobre a Atividade Jornalística no Brasil” traça um diagnóstico do quadro regulatório nacional para o jornalismo, aponta fragilidades e propõe caminhos para seu fortalecimento.

Publicado pela RSF no dia 29 de fevereiro de 2024, o estudo "Marco normativo e políticas públicas sobre a atividade jornalística no Brasil" contribui com as reflexões sobre os desafios regulatórios para a consolidação do direito à informação e a promoção de um ambiente mais favorável ao exercício de um jornalismo livre, plural e de confiança no país. O relatório foi apresentado durante um seminário organizado pela RSF em Brasília com a presença de parlamentares, representantes do governo federal, do Poder Judiciário e de organizações da sociedade civil. A publicação examina a legislação vigente, projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional, políticas públicas federais e iniciativas do Judiciário para jornalistas e comunicadores a partir de quatro dimensões: proteção, sustentabilidade, acesso à e integridade da informação, e ambiente regulatório das comunicações. 

A análise revela que as garantias e salvaguardas existentes no marco normativo brasileiro atualmente não respondem de forma adequada aos desafios contemporâneos para promover um ecossistema informativo livre, plural e diverso, favorável ao exercício do jornalismo.

A liberdade de imprensa requer um conjunto de leis, políticas e medidas em geral aplicadas com uma perspectiva integrada por diferentes instituições para promover um ambiente mais favorável ao jornalismo, de prevenção à violência e à censura, de enfrentamento à desinformação, de regulação democrática e transparente do setor de mídia, de incentivos à pluralidade e à diversidade. Em outras palavras, não se limita à ausência de censura prévia por parte do Estado e exige dos governos democráticos uma postura afirmativa na defesa do direito à informação. Com este estudo, a RSF faz um chamado e aponta caminhos para que as diferentes instituições brasileiras convirjam esforços neste sentido

Artur Romeu
Diretor do escritório da RSF na América Latina

Proteção a jornalistas

O Congresso Nacional deve avançar sobre temas como medidas de prevenção, recebimento de denúncias, respostas rápidas, investigações céleres e responsabilização efetiva. Neste contexto, a proposição e aprovação da Lei Nacional de Proteção, institucionalizando o Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH), assim como a adoção de profundas melhorias no seu atendimento a jornalistas, são tarefas que não podem mais ser adiadas. No âmbito do Executivo, iniciativas como o Observatório Nacional da Violência contra Jornalistas e Comunicadores precisam ser estruturadas com celeridade, para que sejam capazes de oferecer respostas efetivas às vítimas. No Judiciário, o combate ao assédio judicial mostra-se crucial.

Fomento e sustentabilidade do jornalismo

O Estado brasileiro precisa enfrentar com seriedade as consequências das transformações da última década no setor a partir do surgimento de grandes conglomerados online e da redistribuição de receitas de publicidade, que têm ocasionado o fechamento de veículos ou de versões impressas de meios. É imperativo superar o estrangulamento financeiro da radiodifusão comunitária e garantir recursos e autonomia para a comunicação pública. A votação dos projetos de lei tratando da remuneração de veículos jornalísticos por plataformas digitais pelo uso de notícias pode representar um alívio para o setor, mas os textos ainda carecem de aperfeiçoamento visando o financiamento de um jornalismo livre e plural, calcado na diversidade de gêneros, formatos e representações. O Brasil carece de uma política pública que promova de maneira estruturada o pluralismo no país. 

Acesso à e integridade da informação

A despeito de iniciativas positivas do Executivo, como a implementação da Política de Transparência e Acesso à Informação da Administração Pública Federal e do Sistema de Integridade, Transparência e Acesso à Informação da Administração Pública Federal (SITAE), ainda há significativos desafios na implementação da Lei de Acesso à Informação, especialmente pelos municípios. Em relação à  integridade da informação, a agenda é objeto de intensos debates desde 2020, e um entrave chave para a aprovação de uma primeira lei regulando as plataformas digitais é a resistência de forças de extrema-direita no Parlamento somada ao lobby das grandes plataformas. Superar divergências pontuais no texto do PL 2630/2020 para que seja possível formar maioria no Congresso para a conclusão de sua tramitação é uma das prioridades de 2024 para as organizações que atuam em prol da circulação de informações de qualidade e confiança.

Panorama das comunicações

O exame da história recente do marco normativo do rádio e da TV evidencia como os movimentos de governos e legisladores não foram no sentido de modernizar a legislação aplicável a esses serviços, mas de flexibilizar mecanismos anti-concentração e de fiscalização. Infelizmente, a falta de disposição para enfrentar o problema perpassa todo o espectro político brasileiro, com consequências preocupantes para o jornalismo.

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