Coronavírus: Jair Bolsonaro ataca a imprensa em vez de combater a pandemia
Diante da pandemia do novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro assume uma postura negacionista e ataca sistematicamente a imprensa, acusando os meios de comunicação de propagar o pânico. A Repórteres sem Fronteiras (RSF) denuncia uma atitude totalmente irresponsável e inconsequente.
Desde o início da crise sanitária, o presidente Bolsonaro fez ataques públicos sistemáticos à imprensa, que ele considera responsável por uma "histeria" destinada a gerar pânico no país. No domingo, 22 de março, declarou: "Brevemente o povo saberá que foi enganado por esses governadores e por grande parte da mídia na questão do coronavírus". Dois dias depois, em 24 de março, fez um pronunciamento em cadeia nacional no qual reitera sua postura negacionista diante da pandemia, qualificando o novo coronavírus como 'gripezinha', criticando as autoridades locais favoráveis ao isolamento e acusando a mídia de criar um caos artificial: "Grande parte dos meios de comunicação foram na contramão. Espalharam exatamente a sensação de pavor, tendo como carro chefe o anúncio de um grande número de vítimas na Itália, um país com grande número de idosos e com um clima totalmente diferente do nosso. Um cenário perfeito, potencializado pela mídia, para que uma verdadeira histeria se espalha-se pelo nosso país."
Na quinta-feira, 26 de março, o presidente provocou um grupo de jornalistas que o aguardavam do lado de fora do Palácio da Alvorada, sede do executivo federal em Brasília. Dirigindo-se a seus apoiadores, afirmou: "Atenção, povo do Brasil: esse pessoal diz que eu estou errado (ele aponta para os repórteres) e que você tem que ficar em casa. (Olhando para os jornalistas) Agora eu pergunto, o que vocês estão fazendo aqui? Voltem para casa!".
“Essa radicalização e a intensificação de ataques à imprensa é extremamente preocupante”, declarou Emmanuel Colombié, diretor do escritório da RSF na América Latina. “O presidente Bolsonaro escolheu o inimigo errado, atacando, de novo, os mensageiros. Ele força os limites da irresponsabilidade um pouco mais a cada dia. Nesse período de pandemia, o chefe do executivo federal certamente tem coisas melhores a fazer do que atacar os meios de comunicação, cujo trabalho de informação é mais vital do que nunca."
Embora Jair Bolsonaro pareça cada vez mais isolado, seu discurso radical é amplamente divulgado e intensificado por seus apoiadores e alguns membros do governo, incluindo o Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que qualificou, em 28 de março, o trabalho da imprensa como 'sórdido' e 'tóxico' e convidou os brasileiros a “desligar um pouco a televisão”.
Fato particularmente raro: no domingo, 29 de março, o Twitter excluiu, por violação das regras da rede social, dois tweets da conta oficial do presidente em que ele, mais uma vez, questionava a utilidade do isolamento social. Jair Bolsonaro publicou vídeosem sua conta nos quais passeava nas ruas de Brasília, uma conduta em total contradição com as instruções de seu próprio governo e as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Na segunda-feira, 30 de março, a rede social Facebook (e sua subsidiária Instagram) seguiu o exemplo e decidiu, por sua vez, remover os vídeos postados pelo presidente.
A comunicação do aliados mais próximos do presidente é igualmente preocupante: segundo o jornal brasileiro Folha de São Paulo, o Twitter também bloqueou, por doze horas e como advertência, as contas de Flávio Bolsonaro, filho do presidente e senador e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, argumentando que publicaram informações falsas e opiniões que poderiam agravar a pandemia.
O Brasil ocupa o 105o lugar no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019, elaborado pela Repórteres sem Fronteiras.