Jornalistas ao redor do mundo enfrentam a arcaica punição da pena de morte
Condenados à morte, quatro jornalistas do Iêmen e um iraniano, administrador de um canal de Telegram, vivem agora à espera da execução de suas sentenças. A Repórteres sem Fronteiras (RSF) denuncia o recurso à pena capital, uma pena de outra era, que ainda ameaça jornalistas em algumas partes do mundo.
Para os jornalistas iemenitas Abdul Khaleq Amran, Akram Al-Walidi, Hareth Hamed e Tawfiq Al-Mansouri, julgados por um tribunal huti por espionagem, a sentença máxima foi proferida no último dia 11 de abril em Sanaa. Já o jornalista de oposição iraniano Rouhollah Zam, que geria o canal de Telegram do AmadNews, soube de sua condenação à morte por "corrupção na terra" há uma semana, em Teerã.
"É difícil conceber a existência, em 2020, de casos de jornalistas condenados à mais bárbara e arcaica das punições, denuncia o secretário-geral da RSF, Christophe Deloire. Ano após ano, o mundo se aproxima da abolição universal da pena de morte. A ameaça de executar um jornalista por seu trabalho deveria ficar relegada aos livros de história e não fazer parte de nossa atualidade. Os Estados que aboliram a pena devem se mobilizar para que se elimine de vez essa punição de outra era, que é o pior dos obstáculos à liberdade de imprensa."
Com estes casos, sobe para 9 o número de jornalistas atualmente condenados à pena capital. As condenações à morte anteriores datam de setembro de 2017 e foram proferidas pelo Tribunal Central da Coreia do Norte por um motivo irrisório. Os jornalistas sul-coreanos Son Hyo-rim e Yang Ji-ho, e os diretores dos veículos de comunicação para que trabalhavam, Kim Jae-ho e Pang Sang-hun, foram condenados à morte por contumácia - e "sem possibilidade de recurso" - após terem publicado uma crítica positiva de um livro que narra o crescente papel da economia de mercado no cotidiano da Coreia do Norte.
Ainda que a aplicação em si da pena seja pouco provável, no Irã, um dos países do mundo onde mais ocorrem execuções, essas sentenças são verdadeiras espadas de Dâmocles sobre a cabeça dos jornalistas. Nos últimos 20 anos, cerca de vinte jornalistas, blogueiros e jornalistas-cidadãos foram condenados à pena capital. Baseado na sharia, o código penal islâmico do Irã prevê a pena de morte para inúmeros delitos. Soheil Arabi, vencedor do prêmio RSF 2017 na categoria jornalista-cidadão, foi condenado à morte em 2014 por "insulto ao profeta do Islã, aos imãs xiitas e ao Corão". Adnan Hassanpour, que trabalhava para o semanário curdo iraniano Asou (Horizonte), foi, por sua vez, condenado em 2007 à pena capital por "espionagem". Em 2000, Hassan Youssefi Echkevari, dignitário religioso da publicação mensal Iran-e-Farda, foi julgado e condenado por ser um "mohareb" (um combatente contra Deus), por "atividades subversivas contra a segurança nacional", por "difamação das autoridades" e "atentado ao prestígio do clero".
Todas essas condenações acabaram sendo substituídas por longas penas de prisão, às vezes perpétua, mas o Irã continua a ser o país do mundo com o maior número de jornalistas condenados à morte nos últimos 50 anos. Na esteira da revolução islâmica de 1979, cerca de vinte jornalistas próximos ao regime do xá, como Ali Asgar Amirani, Simon Farzami, Nasrollah Arman, ou de meios próximos à esquerda, como Said Soltanpour e Rahman Hatefi-Monfared, foram executados.
Vizinho do Irã, o Iraque se destaca como o último país a ter aplicado a pena de morte a um jornalista: há 30 anos, no dia 15 de março de 1990, o jornalista britânico de origem iraniana Farzad Bazoft foi executado na forca por "espionagem a favor dos serviços de inteligência britânicos e israelenses".
Desde essa data, as organizações de defesa da liberdade de imprensa e dos direitos humanos precisaram se mobilizar inúmeras vezes para evitar o pior para diversos outros jornalistas e blogueiros. Na Mauritânia, o blogueiro Mohamed Cheikh Ould Mohamed Mkhaïtir foi condenado à morte no final de 2014 por apostasia, após publicar um artigo no Facebook. A sentença acabou sendo revertida para dois anos de prisão no final de 2017. Na Birmânia, o jornalista esportivo Zaw Thet Htwe foi condenado à morte em 2004 por ter transmitido informações à Organização Internacional do Trabalho, até que a Corte Suprema o condenasse, depois de um recurso, a três anos de prisão.
A importante mobilização em torno de casos emblemáticos, como o do fotógrafo Shawkan no Egito e do correspondente da RFI na região do extremo norte dos Camarões Ahmed Abba, contribuiu para frustrar as intenções iniciais dos juízes desses países em relação à pena de morte. Nesses dois casos, assim como no do jornalista saudita Ali Al-Omari e do jornalista afegão Ali Mohaqiq Nasab, os procuradores haviam solicitado a pena de morte por conta de acusações de "atos de terrorismo" e de blasfêmia que pesavam contra os jornalistas. Mas as sentenças proferidas em primeira instância não foram executadas.
Na China, um dos 54 países que aplicam até hoje a pena de morte e que detém o recorde de mais pessoas executadas, o último jornalista condenado à morte e executado foi, segundo informações obtidas pela RSF, o correspondente da agência Associated Press Yin-Chih Jao em 1951. Contudo, as penas de prisão de longa duração e de prisão perpétua proferidas contra os jornalistas, associadas às condições de detenção deploráveis e aos maus tratos, acabam por equivaler a condená-los de fato à morte. Em 2017, Liu Xiaobo, ganhador do Nobel da Paz e do prêmio RSF em anos anteriores, e o blogueiro Yang Tongyan morreram em decorrência da falta de cuidados na prisão.
Na América Latina, onde a maioria dos países aboliu total ou parcialmente a pena de morte há várias décadas, não houve condenações à pena capital nos últimos 50 anos. Entretanto, a participação direta ou indireta dos Estados em casos de execução extra-judiciais de jornalistas, por matadores de aluguel, mercenários ou pelos cartéis, é uma constante em vários países da região, especialmente na Argentina, no Chile, no México, no Brasil e na Colômbia.
Grupos armados também são responsáveis pela execução de jornalistas. Deixaram marcas indeléveis as bárbaras decapitações de dois jornalistas americanos, James Foley e Steven Sotloff, pelo Estado Islâmico (EI) em agosto de 2014, em represália à intervenção dos Estados Unidos na Síria e no Iraque. No Afeganistão, desde 2001, uma dezena de jornalistas e colaboradores de meios de comunicação foram executados pelos talibãs. Entre eles, o correspondente da BBC Abdul Samad Rohani, morto a tiros em 2008; e Adjmal Nashqbandi e Sayed Agha, que colaboravam respectivamente como fixer-intérprete e motorista com um jornalista do diário italiano La Repubblica, ambos degolados.
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