A liberdade de imprensa sujeita às transformações políticas nos países da região Ásia-Pacífico
Na região, duas ascensões significativas - cada uma de 22pontos - ilustram, como se ainda fosse preciso, até que ponto o ecossistema político de um Estado influencia a situação da liberdade de informação. Na Malásia, a primeira alternância política em 62 anos de independência trouxe uma renovação para a imprensa até então totalmente esclerosada, mudando profundamente o ambiente de trabalho dos jornalistas. Como resultado, o país foi alçado ao 123olugar. E nas Maldivas, a chegada ao poder de um novo presidente que tinha assumido compromissos fortes em favor da liberdade de imprensa - em parte cumpridos - garantiu um avanço significativo para arquipélago do Oceano Índico, que se encontra agora no 98olugar do Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa.
Os buracos negros da informação se aprofundam
Como num espelho invertido, a China (177o) e o Vietnã (176o) conseguem a façanha de perder um ponto, ainda que os dois países já estivessem estagnados na parte mais baixa do Ranking. A causa, uma tomada absoluta de poder pelos presidentes Xi Jinping e Nguyen Phu Trong: o primeiro modificou a constituição de seu país para poder ser "presidente vitalício" em março de 2018, enquanto o segundo agora acumula as funções como chefe do partido comunista e do Estado. Seus respectivos clãs se esforçam, por um lado, para silenciar qualquer debate interno na imprensa oficial e, por outro lado, para realizar uma caçada absolutamente implacável a jornalistas-cidadãos. O Vietnã mantém, assim, cerca de trinta jornalistas, profissionais ou não, atrás das grades, e a China mantém quase o dobro.
O contra-modelo chinês, baseado na vigilância orwelliana e na manipulação de informações graças às novas tecnologias, é ainda mais alarmante porque Pequim está agora promovendo sua estratégia repressiva fora de suas fronteiras. Além de dificultar o trabalho de correspondentes estrangeiros em seu solo,a China procura estabelecer uma "nova ordem global da informação"sob sua égide, como a RSF revelou em um relatório publicado recentemente.
O Laos também perde um ponto (171o), especialmente por não deixar jornalistas cobrirem o dramático colapso de uma barragem em julho de 2018. Inexoravelmente, os três estados-partidos estão se aproximando de seu "irmão" norte-coreano : Pyongyang avançou de uma posição (179o, +1), em particular, graças a uma aparência de abertura permitida pelas cúpulas reunindo os presidentes Kim e Trump.
Censura e autocensura generalizadas
Com ataques a imprensa independente, outros contra-modelos são cada vez mais inspirados pelo exemplo chinês, começando por Cingapura (151o), que estabeleceu a autocensura como regra - assim como o Brunei (152o, -1) ou a Tailândia (136o). Da mesma forma, a censura tornou-se a norma no Camboja (143o), onde o governo se dedicou a aniquilar qualquer imprensa independente, ou mesmo em Hong Kong (73o), onde os grandes veículos de comunicação tradicionais se dobram, agora de bom grado, aos desmandos de Pequim.
Na ausência de garantias quanto à independência editorial das autoridades, a Papua Nova Guiné (38o) e as Ilhas Tonga (45o) também foram marcadas por um aumento da autocensura em 2018. Especialmente, no Paquistão (142o,-3), a pressão exercida pelo establishment militar sobre a imprensa, antes da eleição geral de julho de 2018, levou ao agravamento da censura, reminiscente dos piores momentos de ditadura no país.
O trabalho de campo para a cobertura dos fatos por ser letal
Os jornalistas paquistaneses também estão na linha de frente em campo, onde operam em um clima muito inseguro. Pelo menos três deles foram mortos por causa de seu trabalho em 2018. A situação de insegurança é ainda mais preocupante no Afeganistão (121o) que, apesar dos esforços das autoridades, viu dezesseis profissionais da mídia caírem no front da informação, nove dos quais em um ataque duplo explicitamente destinado à imprensa - um sinal da coragem que se precisa ter agora para ser repórter em campo. De uma forma menos dramática, mas igualmente preocupante, jornalistas que queriam cobrir os protestos e as eleições em Bangladesh (150o) foram expostos a uma exacerbação sem precedentes da violência.
Esses ataques físicos contra jornalistas são encorajados pelo fato de que a maioria de seus perpetradores goza de total impunidade, como ainda é o caso no Sri Lanka (126o), por exemplo. Na Índia (140o, -2), pelo menos seis jornalistas foram mortos em 2018 enquanto tentavam fazer o seu trabalho. Há um aumento generalizado de casos de violência vinda de todas as partes: forças de segurança, grupos criminosos, ativistas políticos etc.
Assédio digital e desinformação
Além de sofrerem com ataques durante a cobertura, os jornalistas indianos também se tornaram alvos recorrentes de violência na internet. Nas redes sociais, todos aqueles que ousam criticar a ideologia nacionalista hindu, defendida pelo Primeiro Ministro Narendra Modi, são qualificados como elementos "anti-indianos" que é preciso purgar - o que dá origem a campanhas de assédio virtual com ameaças de morte ou estupro, as mulheres jornalistas sendo os alvos preferenciais dos exércitos de trolls. Um fenômeno que também identificamos nas Filipinas (134o,-1), onde os insultos lançados pelo governo de Rodrigo Duterte contra a imprensa independente são acompanhados por ataques cibernéticos coordenados contra seus representantes. O caso mais emblemático é, sem dúvida, o do site Rapplere de sua diretora Maria Ressa que, além de sofrer com campanhas de assédio online, enfrenta uma série de ações judiciais instrumentalizadas por diferentes agências governamentais.
A instrumentalização das redes sociais é igualmente preocupante na Birmânia (138o,-1), onde a desinformação desenvolveu-se sem moderação no Facebook, banalizando mensagens de ódio anti-Rohingya em favor dos discursos de Aung San Suu Kyi - que manifestou um silêncio absolutamente ensurdecedor quando os jornalistas Wa Lonee Kyaw Soe Oo foram condenados a sete anos de prisão, em setembro passado, por tentar investigar sobre o genocídio.
As democracias submersas?
Essas ondas de desinformação contribuem em grande parte para a erosão democrática que afeta toda a região, sendo a liberdade de imprensa a primeira vítima. Uma forte onda à qual as democracias têm cada vez mais dificuldade de resistir, levando muitas delas a estagnar no Ranking da RSF. Sob o pretexto de regular as redes sociais, alguns governos, como no Nepal (106o) ou em Samoa (22o), por exemplo, adotaram textos que restringem e dificultam o jornalismo investigativo.
A ausência de reformas estruturais a favor de uma imprensa mais livre também impede que países como a Coreia do Sul (41o) ou a Indonésia (124o) progridam. O exercício do jornalismo independente também é particularmente difícil quando o ambiente midiático é fortemente polarizado, como em Taiwan (42o) ou na Mongólia (70o).
O pluralismo em perigo
Finalmente, o pluralismo da imprensa suporta cada vez menos a lógica da concentração comercial e dos interesses econômicos, como o deploramos no Japão (67o) ou na Austrália (21o, -2). A Nova Zelândia (7º, +1), que lida com fenômenos semelhantes, no entanto, aparelhou-se com uma entidade reguladora da mídia que tem sido capaz de proibir o excesso de concentração. O país está ganhando por isso um ponto, sinal de que as garantias político-institucionais estão dando frutos.
Nesse cenário particularmente preocupante, algumas vitórias tímidas devem ser observadas: ao permitir uma cobertura justa das eleições gerais de 2018 nas Ilhas Fiji (52o, +5), no Timor Leste (84o, +11) e no Butão (80o, +14), os meios de comunicação desempenharam plenamente o seu papel - embora a imprensa ainda esteja em construção nestas jovens democracias. O progresso desses três países ilustra a importância fundamental, para o desenvolvimento de uma sociedade democrática, de ter jornalistas que possam trabalhar livremente sem medo de pressões ou represálias